27 de junho de 2008

Arrepios XV...


Há alturas em que os acontecimentos se precipitam e mais vale não fazer nada.

No breve espaço de tempo que levámos a transpor o lobby comecei com o desagradável constrangimento de ter dado de caras com um ex-colega de quem nem sequer gosto, continuei com a agradável surpresa de ver a nossa "amiga" da tarde, para acabar na completa surpresa de, acto contínuo, os ver a discutir. Aproveitei para ir direitinho para o restaurante e evitar conversas.

Já durante o jantar, pelo canto do olho, apercebi-me dele a sair, visivelmente irritado, e ela a entrar no restaurante, acabando por jantar sozinha.

Qual seria a relação daquele tipo com ela? Na verdade não parecia nada pacífica. No entanto, ainda bem que assim foi porque, pelo menos, não tive que fazer conversa de circunstância com um tipo que era bem capaz de perguntar pela minha mulher. A verdade é que ele foi embora "pior que estragado" e ela ficou a jantar sozinha. Iria passar a noite?


Um sorriso mental invadiu-me. Será que a minha amiga tinha somado dois e dois e chegado à conclusão que eu morava demasiado longe para ir dormir a casa? Teria ligado isso com o facto de estarmos a jantar num hotel? Se o fez não o denunciou.

Eu gosto de uma provocação mas não perco a compostura. Há alturas em que não se pode ser consequente nas respostas e aí o melhor é ficar caladinho. No entanto, aquela resposta ficou a deambular na minha cabeça, a seu tempo se veria quem estava à altura das suas provocações. Para já, deleitava-me a alimentar o ambiente "denso" que se instalou. Por vezes a tensão alimenta a...


Já no bar, a conversa fluía descontraída, embalada pelo "Balvenie Portwood" e pelo som do piano. A ilustre desconhecida tinha estado algum tempo no balcão do bar, de copo na mão e parecia ter ido até à varanda. Se nos reconheceu, não o demonstrou. Pareceu-me fechada em si própria.


Eu estava um pouco apreensivo com o facto de ter sido visto por aqui por aquele tipo, alguém que não morria de amores por mim. Tinha como certo o lugar que ocupo neste momento na empresa e nunca o "digeriu" convenientemente. O tipo de pessoa que me prejudicaria se pudesse. Decidi saber mais.

- Importa-se que a abandone por um momento?

- Pode saber-se onde vai ou é segredo?

- Entre outras coisas, preciso de ir ao carro fazer um telefonema. Deixei lá o telefone para não sermos incomodados. Não demoro.


Passei pelo bar, perguntei ao barman, já conhecido, o que aquela senhora tinha estado a beber. Ele, com um sorriso cúmplice mas sem qualquer comentário, serviu-me uma dose que eu levei. Estava de facto na varanda como eu antecipara.

- Uma indiscrição em troca de uma bebida? Boa noite.

- Quem disse que eu queria uma bebida?

- Ninguém, mas aproveito para a compensar da que perdeu hoje à tarde, em parte por minha culpa.

- Presunção e água benta...

- Cada um toma a que quer, eu sei. No entanto, feliz ou infelizmente, conheço a pessoa que estava a falar consigo e gostava de saber se ele me viu.

- O meu marido? Pelos visto andava demasiado ocupado a perseguir-me. Não disse nada a respeito, se isso o conforta.

- Posso cometer a indiscrição?

- Quem disse que eu aceitava a bebida?

- O que se passou?

- Combinámos um fim-de-semana para descansarmos um do outro e pelos vistos viemos parar ao mesmo sítio. Pensei que me tivesse seguido mas já não tenho a certeza. De qualquer modo foi-se embora.

- Quer fazer-nos companhia?

- Ainda faltam acontecer algumas coisas entre vós para a companhia de alguém vos ser agradável.

- O que quer dizer?

- Que estão na fase da exploração. Aquela em que, quanto mais gente pior.

- Gosto de mulheres perspicazes. De qualquer forma, sinta-se à vontade para se juntar a nós se lhe apetecer. Quando for para a mesa vou comentar que encontrei uma pessoa conhecida.

Com a nítida sensação de que não o faria, passei pela recepção e voltei à mesa.

- Pensava que me tinha abandonado...

- Peço desculpa. Encontrei uma pessoa conhecida. Imagine que esteve a jantar na mesma sala que nós e não reparei nela.

- Alguém especial?

- A mulher de um ex-colega meu. Só quis que percebesse que não a tinha ignorado propositadamente mas apenas porque estava focado noutra pessoa.

- E estava?

- Ao jantar tornou a responder-me a uma pergunta com outra, é um hábito seu ?

- Pensei que a minha resposta estava implícita. Perguntou-me se eu estava à altura das minhas provocações. Eu perguntei-lhe se estava à altura das suas. Foi você quem não respondeu à minha pergunta.

Olhei-a nos olhos, enquanto passava para a sua mão o cartão do quarto, reservado no dia anterior.
O Ele

1 comentário:

claras disse...

Assim já gosto mais...

beijinho